Entrevistámos o Nuno Lumbrales. Foi na Alfaiataria ainda à porta fechada numa conversa intimista embalada a vinho do Porto. Quisemos saber um pouco sobre o Nuno, um tipo que hesitamos em catalogar como um conservador progressista ou um progressista conservador. Mas uma coisa é certa, se fosse um personagem da Guerra dos Tronos seria Sir Lumbrales, Defensor do Reino e Assador de Chouriços.
E foi assim...
Alfinete - Vamos começar pelo princípio. Infância. Sabemos que nasces em Dezembro de 76. És Sagitário ou Capricórnio?
Nuno Lumbrales - Sagitário
A-Ligas a signos
NL-Nem por isso
A- Ainda assim, és um sagitário típico
NL-Sim, acho que sim.
A- Em quê?
NL- Talvez na reflexão
A - E de resto?
NL - Cresci em Lisboa. Primeiro quando os meus pais ainda viviam com os meus avós junto ao Técnico, depois ao pé do Campo Pequeno.
A - És menino das Avenidas Novas então
NL - (risos) Sim, sou. Bom, é isso. Estudei no Sagrado Coração de Maria.
A - Estudar lá é muito diferente da Escola Pública?
NL-Não sei bem porque não tenho o termo comparativo. Mas suponho que fossemos mais controlados. Era tudo mais formal.
A - E crescer nessa altura, ali entre os anos setenta e os anos noventa era muito diferente de hoje?
NL - Acho que era um meio termo. Não tinha esta coisa mais fechada de hoje em dia mas também já não foi aquela infância da rua que os nossos pais tiveram.
A - Depois vem a faculdade. Porquê Direito?
NL - Porquê Direito? Foi uma coisa que me deu que pensar no 9º ano. Eu era um tipo de notas equilibradas quer nas Letras quer nas Ciências. Não sei, talvez os meusinteresses se inclinassem mais para aí...
A - As letras. E o Direito mais em específico?
NL- Havia tradição na família mas acho que nem foi isso.
A- Foi para fugir à matemática?
NL - Não, a Matemática pedia-me mais esforço mas não foi por isso.
A- Foi pelos filmes?
NL- Também não.
A - A Advocacia não é como os filmes, pois não?
NL- Não é.
A advocacia real não é como nos filmes. A rotina é mais comezinha
A - O que é que é diferente?
NL- São filmes. A rotina é mais comezinha. Não é sempre aquela emoção dos grandes casos. Bom, os filmes são quase sempre sobre o Direito Anglo-Saxónico que é diferente. Mas nem o Direito Anglo-Saxónico é assim.
A - Mas tu querias ser advogado...
NL - Eu nem queria ser advogado. A minha ideia era depois fazer jornalismo. De investigação. Algo assim. Acho que só mais para o fim do curso é que comecei a pensar que se calhar advocacia fazia sentido. E acho que só depois do estágio ter corrido muito bem tive a certeza.
A - E esse momento de sair da faculdade e cair na vida prática, como foi? É uma carreira em que a responsabilidade pesa. Como é esse choque?
NL-Sim, em Direito há sempre resposabilidade, independentemente do valor, mas sim, claro. Há casos mais melindrosos. Eu não senti tanto essa pressão inicial porque estagiei numa estrutura muito boa e preparada. Havia muito controlo sobre tudo.
A- Estagiaste e fizeste carreira numa grande sociedade.
NL - Sim, ainda foram 9 anos.
A - Mas depois saíste...
NL - Saí e montei a minha pequena sociedade junto com o meu pai. Basicamente reiniciámos o escritório que ele já tinha.
A - E agora uma pergunta provocatória. És portanto um empreendedor. E a pergunta é provocatória porque sei que pelo menos alguns dos teus colegas não gostam que se fale de um advogado como empresário. Pensas assim?
NL- Bom a advocacia é uma atividade muito particular. Trabalha uma área muito sensível e tem um enquadramento muito específico. Não é uma qualquer empresa comercial, isso não. Mas lato sensu, claro, é uma empresa, é uma atividade económica.
A- Mas porque é que a Ordem dos Advogados é tão conservadora? Pensemos por exemplo na medicina. Se o Grupo Mello quiser fazer um outdoor com uma médica bonita pode. Mas se tu quiseres filmar um anúncio sexy vais ter problemas como as outras moças. Isto faz sentido?
NL- Eu não conheço o Estatuto da Ordem dos Médicos. Suponho que seja mais permissivo ou pelo menos interpretado de forma mais permissiva. Não sei. Mas de facto a Ordem dos Advogados é conservadora.
A-E isso faz sentido?
NL- Acho que se podia rever alguma coisa. Mas com prudência.
A-Porquê?
NL-Porque é mais fácil ir abrindo aos poucos um pouco mais a porta do que fechar uma porta que se abriu em exagero.
A - Olha, vamos falar de política. Gostas de política.
NL- Sim.
A - E como te situas?
NL - Não sou alguém com uma ideologia muito definida. Considero-me um moderado de Direita. Alguém que acredita neste sistema mas também acredita que há muita coisa que podia ser corrigida.
A - E o que é isso de ser moderado de direita?
NL - É acreditar nas liberdades e autonomias dos privados como o melhor motor de progresso. Crer que não deva haver um Estado gigante que se imponha. Mas ao mesmo tempo que esse Estado deva ser relevante. Como garante da Ordem, dos Direitos fundamentais. Um estado facilitador e um Estado com alguma componente de correção dos desiquilíbrios e incapacidades de subsistência mais críticos.
A- E afinal o que é que distingue a esquerda da direita?
NL-Nos modelos moderados é mais uma diferença de grau na ponderação entre iniciativa privada e intervenção estatal, sem colocar nenhuma em causa do que propriamente uma cisão ideológica.
A - E a política ativa como a vês?
NL- É importante, sobretudo se queremos depois ter créditos para criticar. A participação em alguma medida é importante.
A - Já pensaste em fazer política?
NL - Sobre isso sou ambivalente. Sim atrai-me. Mas depois tenho dois problemas: tempo para tal e o medo que no fim de contas desse por mim perdido sobretudo em discussões um bocado inconsequentes para os problemas realmente importantes.
Mas depois temos na política como em todo o setor público uma questão sistémica de ineficiência. Em quase tudo o privado é mais eficiente.
A-Temos maus políticos?
NL-Teremos bons e maus. Prefiro pensar que os bons são mais. Mas depois temos na política como em todo o setor público uma questão sistémica de ineficiência. Em quase tudo o privado é mais eficiente.
A-Porque é que achas que isso sucede?
NL- Porque os privados têm a verdadeira necessidade de serem viáveis. Quando uma gestão corre mal a empresa extingue-se. No público a má gestão é inconsequente porque o Orçamento de Estado pode sempre por a mão por baixo.
A- E este Governo vai no caminho certo?
NL-Alguma coisa tinha que ser feita. Suponho é que houvesse muitos caminhos. O deste Governo pode não ter sido perfeito.
A - Consegues dar-nos uma opção boa e uma má deste Executivo? Meros exemplos...
NL- Olha a função Pública. Eu não digo que as medidas concretas fossem as melhores ou as mais justas. Mas algo tinha que ser feito e a coragem dessa reforma é positiva.
A - E um erro?
NL - Não se terem atacado coisas como as PPP e outros interesses. Não necessariamente pelo impacto financeiro mas pela moralização subjacente.
A - E porque é que o Governo não fez isso?
NL - Isso gostava eu de saber!
A - Agora vamos falar um pouco mais de ti. És um homem de fé. Católico...
NL- Sim, sou. Fui educado como católico. E mantive sempre a fé. Enfim, há quem se afaste, claro. Simplesmente porque sim. Porque conclui que não acredita em nada daquilo. Eu acredito em Deus, acredito nos princípios. Sinto-me bem com a minha fé.
(...)digo que senti Deus. É claro que também já senti o Seu silêncio. Mas ele faz parte (...)
A - Já alguma vez sentiste Deus, ou enfim, sentes Deus?
NL- Já senti. Quem não tenha fé chamar-lhe-à talvez outra coisa qualquer. Mas eu como tenho fé digo que senti Deus. É claro que também já senti o Seu silêncio. Mas ele faz parte, aliás não te posso falar muito sobre isso até por impreparação mas há mesmo muita doutrina canónica justamente sobre isso. O silêncio de Deus.
A - E sobre a Igreja atual o que nos dizes?
NL - É uma estrutura muito conservadora mas com passos positivos de evolução.
A- Tens um Papa favorito?
NL- Nao "vivi" muitos. Gostei muito de João PAulo II. Um homem conservador mas inspirador e que inspirava bondade. O Ratzinger tinha-o como mais fechado, menos simpático. Acabou por me surpreender pela positiva. Agora temos este. Menos conservador, também inspirador. Gosto dele e tem feito coisas corajosas como atacar a corrupção dentro da Igreja.
A- E mais da tua vida privada?
NL - É privada! (risos)
A- Conta lá.
NL - Pacata. Gosto de Desporto embora hoje já só futeboladas de amigos. Gosto de jogar um jogo baseado no «Game of Thrones». De ler embora ande a ler muito pouco.
A - Pergunta cliché: livros favoritos
NL - Sobretudo romance histórico. O Primeiro Homem de Roma é a grande referência. Depois também cito sempre Sun Tzu. Um manual de estratégia militar antiga cheio de ideias atualíssimas para a gestão atual.
A - E como é que um gajo como tu da advocacia vem parar a esta salsada da Alfaiataria?
NL - Culpa tua! (risos). Isto começou com uma aventura com um grupo mais extenso de amigos que queriam inventar um negócio. Pelas inclinações pessoais da maioria a área de eventos resultou óbvia. Mas a coisa foi evoluindo, foram todos saindo até que ficámos eu e o Rui Azevedo e a evolução do Projeto que é a Alfaiataria.
A - Tens a Lumbrales & Associados e agora a Alfaiataria. É difícil empreender em Portugal, a este nível da start up?
NL - É complicado. Tens que ter juízo. Planear bem, evitar megalomanias. Perceber se aquilo que queres fazer tem mercado e se tens capital ou financiamento suficiente para o projecto. E, claro, também se tens o know how. Meteres-te de cabeça em algo sobre o qual não saibas nada é má ideia. E no fim de tudo ter um plano B. Ou seja um plano de fuga se a coisa correr mal. Saber sair a tempo e estancando as dívidas se for necessário.
A - E o Estado ajuda?
NL - Claro que não! (risos) O Estado regral geral só complica. Com um IVA e um IRC que tens que pagar cobres ou não a fatura, com licenças para tudo e mais um par de botas, etc...
O que mais me motiva na Alfaiataria é o lado do Clube. Criarmos um sítio, um ponto de encontro um pouco mais intimista. Onde se saiba que param os nossos amigos e onde estamos todos em casa.
A - E o que é que mais te motiva na Alfaiataria?
NL - O lado do clube. Criarmos um sítio, um ponto de encontro um pouco mais intimista. Onde se saiba que param os nossos amigos e onde estamos todos em casa.
A - Então na Tag de Grémio de Artes e Relações metes a sílaba tónica nas relações.
NL - Nas artes também. Sobretudo porque ao sermos um clube embora haja ali uma velocidade de cruzeiro como bar podemos fazer tudo aquilo que quisermos, e essas actividades também vão acabar por ser definidas pelos gostos e inclinações dos vários sócios que forem entrando.
A- Por falar em expressão. Uma sócia nossa amiga comum dizia-me no outro dia divertida que uma das curiosidades dela era ver o Dr. Nuno Lumbrales a tirar bicas e agitar cocktais. Isso leva-me a uma pergunta, que talentos especiais do Dr. Nuno Lumbrales poderá a Alfaiataria mostrar ao seu público?
NL - Bom, assim à partida... Assar chouriço! Podem aparecer aí mais umas coisas. Mas assar chouriço, isso de certeza!